terça-feira, junho 23

Dou um beijo na testa dela e apenas sorrio. Depois sigo em frente.

Todas aquelas palavras e histórias e reclamações vão ficando pra trás. Já não tenho motivos pra fingir interesses.

Ela também (agora) parece não querer nada. Mas, como um objeto jogado aos prazeres do mar, um dia a lembrança será mais forte e o fará voltar.

As águas desta vez a trouxeram num ponto onde minha vista consegue enxergar, muito distante. Minutos depois aquela visão sumiu, deixando tantos rastros quanto o beijo, vindo da sempre distante e amarga boca, que nunca tive.

Restos de um pequeno barco revelam minha trajetória de vida: remei com força, mesmo em momentos de tempestade. Quando avistei rochas, já era tarde. Acabei desacordado, em ilha remota.

Chove agora.
Ah, bem percebido.

Estava bem desanimado sim,
E de mente conturbada,
E de olhar sem fim,
E de angústia no peito
E de cara sem riso

É tudo vida.

Bruna

O Sol ao fundo já ia se recolhendo, dando espaço para a lua, estrelas e desejos permearem a alma da cidade em movimento contínuo.
Relógios e telefones celulares também anunciavam o cair da noite, ou melhor, a hora de partida do trabalho. Logo pontos de ônibus se apinhariam de gente consumida pelo mundo moderno, que não mais olhava o céu, as estrelas ou mesmo a lua. Pensamentos confusos transbordavam naquela maré humana.
No entanto, alguns faziam o caminho inverso. Trabalhavam o corpo ou mente, assim que viam os raios solares indo embora.
Linhas e mais linhas formavam-se sobre a folha de caderno. Eram as linhas de um rosto talvez; tinha uma espécie de sorriso amargurado, ou constrangedor. A mão que executava tudo era certa em seus atos e rápida no preenchimento. Os olhos prestavam atenção nos traços e na bela noite que ia surgindo. Tentava lembrar de uma idéia, não queria que esta tivesse o mesmo triste fim de outras tantas, descartadas no galpão dos esquecimentos.
Enquanto o desenho ia tomando formas de rosto humano, feminino, um manso mar de realização encobria e começava a transbordar por entre os olhos e óculos da menina desenhista.
Finalmente, já sabia o motivo daquela peculiar idéia de montar um rosto permanecer em sua mente durante tanto tempo: era o rosto de uma amiga formando-se através de seus ligeiros e cadenciados traços! Como fez tudo aquilo e só agora conseguira identificar sua própria criação? Pergunta que pairará sobre nós, mas de qualquer maneira os instintos ou qualquer coisa outra tinham guiado mãos e formas para que o resultado fosse alguém tão familiar.

Um sorriso então. Um sorriso tornou-se a arma contra o tédio.

domingo, junho 21

Um dia, nada mais de especial. A saudade resolve mostrar-se grande e reviver o desejo de vê-lo outra vez, desejo este já mais que esquecido nas entranhas do passado.

Mas antes que ele também pudesse revê-la depois de hiato tão longo, a saudade enfim, passou.
E assim, o outono em seu bom friozinho se vai.

quinta-feira, junho 11

Depois perdeu a casa
E então a mulher,
os filhos, a geladeira,
o cão.

Primeiro perdeu a vida.

segunda-feira, junho 8

Preguiça de viver

Outro dia, outra tarde passando bonita aos nossos míopes olhos, através da brutal realidade.

As risadas desconexas parecem mais gostosas e sinceras que o pôr-do-sol, lindo pôr-do-sol.

Tão presente e por tanto tempo irrelevante. Pensemos melhor.

O verde do vale pode continuar lá, parado, pra sempre.

Cabe a nós explorá-lo enquanto o tempo nos permite a tarefa louca de viver humano.

Rezar ou chorar, não sei o que deveríamos. Aproveitar? Ainda não aproveitamos nada.

Já faz aquele frio gostoso de outono e a falta de luz natural me chama pra casa, pro aconchego.

A mente não quer largar o frio. Ou a cidade la fora, ou o verde, ou o vale, ou a menina não te esperando com um sorriso no rosto, ou ele feliz. Não quer.

Quero um cigarro. Cigarro este pra comemorar o mais novo câncer do mundo: eu,
você

E todos nós, juntos.

sábado, junho 6

B de Bukowski*

 

            O armário continuava a ranger e o ventilador parecia não surtir efeito contra o pegajoso e podre calor que agora já infestava toda a casa. O cigarro aparecia como o último remédio contra aquilo tudo. E, de fato, talvez fosse.

            Mas era segunda-feira ainda e o calendário apontava pra mais uma feliz semana de trabalho como pedreiro na construção de um prédio qualquer.

            Desligando o velho radinho de pilha, foi dormir num colchão furado estendido por ali.

 

            O despertador foi rápido ao torturá-lo para levantar e sair daquele quartinho (que permanecia, mesmo de manhã, um forno).

            Com um pingo de remorso ele ficou assim que bateu forte no diminuto aparelhinho irritante. Coitado! não tinha culpa do horário que deixaram pra despertar. Apenas fazia seu trabalho.

 

            - Merda! É sempre assim! Amiguinhos meus da terceira série iriam dizer a mesma coisa; mafiosos, traficantes e outros filhas-da-puta também.

            ...Eles ainda seguem regras. Muitas regras.

 

            Seguiu rápido para lavar a cara – ainda moribunda – e contemplar o estrago que o último porre deixara seu rosto.

* Texto incompleto.


Olhar diferente*


            Um garoto, com uma face onde se lia facilmente qualquer coisa de enigmático, chegou perto de um moço sentado naquela praça e perguntou, sem muitos rodeios:

            - Moço, por que quando você olha, seu olhar é diferente das outras pessoas?

            - Porque eu olho com outros olhos as coisas. Vejo tudo diferente, disse o rapaz, sem muita pressa.

            - Vê tudo azul?

            E um leve sorriso deslizou no rosto daquele jovem.

            - Azul não, mas diferente, como se visse a vida de outro jeito, aí também olho com outro jeito pro mundo. Mas me diga, como é que descobriu que meu olhar era diferente dos outros?

            - Foi fácil, na verdade. Você é o único que não olhou alguém jogar dinheiro pela janela.


*Texto antigo.

 

Planos abortados, mal

fadados, sem sucesso,

trabalhosos, inúteis, bobos,

fracassados.

 

Meu passado e futuro

amoroso.

quinta-feira, junho 4

dia-dia

Seis horas com sono, cansado já, despertador: barulho, barulho (chato), óculos ali em cima, água fria. Por que tão cedo? Café, pílulas (várias), banheiro água fria roupa material. Elevador.
Elevador. Portão transporte, sentei (e dia nem é ainda), gente entrando mais gente. Silêncio, silêncio. Clareou, esquentou, lotou. Escola na paisagem.
Saímos todos, caras feias, su-bi-mos, andamos andamos, su-bi-mos novamente. Ar, onde está? Falta...

Pronto, melhor. Mochila carteira meu lugar marcado. Aula, aula, aula, aula, aula, aula. Pessoas pelo pátio passeando e passando, procurando por pessoas.
Olha, ali em embaixo: um feliz, risadinhas com o amigo, garotinhas belas & burras passam ao lado. Garoto de óculos no canto, ruminando. Vai matar a todos (!).
“Quantos minutos?” “Poucos, já vai acabar.” “TRIIIIIIIIIIIIIIMMMMMMMM.” “Acabou” “ainda não...”.
E nós, como dois sobreviventes de batalhas, no exato momento que se segue ao último tiro disparado, des-ce-mos as es-ca-das. Outras tantas histórias pareciam ir conosco, descendo aqueles gélidos e sujos degraus, mau cuidados pelo tempo e por nós mesmos. Mortos ali? Nenhum, mas se a visão fosse perfeita... Histórias e mais histórias infindáveis pra se contar!

Professores – nossos mestres -, apostilas – nossas bíblias – e seguiu o tempo finito da morte vivida diariamente.
“TRIIIIIMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM” – “Finalmente”

terça-feira, junho 2

Do not

 

 


Do not.

Do not enter, do not pass, do not exit, do not quit.

Do not walk, do not smile, do not smoke, do not drink, do not sleep, do not have sex,

Do not speak (with strangers), do not write, do not read, do not think.

Don’t.